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As funções do enquadramento

Descubra quais são as funções do enquadramento, além de aprender as definições desse recorte e entender como cada escolha cria um efeito no espectador.

há 4 anos 5 meses

No jogo de significação do cinema são vários os elementos de produção de sentido: a iluminação, o som, a montagem… E no artigo de hoje vamos tratar das funções do enquadramento.

Diferente da montagem, o enquadramento não é um elemento exclusivo do cinema. Assim, ele herda uma tradição não apenas da fotografia still, como também de outras artes visuais, como a pintura, o desenho, a gravura. São séculos de uma bagagem com convenções que já foram subvertidas inúmeras vezes.

O enquadramento é como uma moldura que define os limites do quadro. Sua primeira função é recortar parte daquele mundo que está sendo representado. E esse recorte deriva nosso “dentro de campo” e “fora de campo”. O dentro de campo diz respeito aquilo que visualizamos na imagem, que foi privilegiado pelo enquadramento. Enquanto o fora de campo é uma extensão que presumimos existir para além do que é mostrado.

Na imagem abaixo, apesar de vermos apenas Jack e Rose, sabemos que eles estão posicionados a frente do navio e rodeados pelo oceano. Essa construção do espaço é resultado, principalmente, dos planos apresentados anteriormente - como a caminhada dos dois até a proa, ou até mesmo planos gerais que localizavam dos dois já naquele lugar.

Mas são várias as formas em que os cineastas podem sugerir uma extensão do espaço para além do enquadramento. O personagem pode olhar para algo fora de campo, ou podemos ouvir um som que não tem origem no que está dentro do enquadramento. Esse é um recurso usado exaustivamente em filmes de suspense, onde a linha entre o que será mostrado ou não é o que gera a tensão no espectador. Em Tubarão (1975), de Steven Spielberg, por exemplo, a trilha sonora é capaz de evocar a presença do animal sem ao menos mostrá-lo.

E essa escolha de como recortar o mundo, a partir do enquadramento, produz diferentes sentidos para o espectador. E para estabelecer uma análise dessa significação não existe fórmula pronta. É muito conhecido o uso do contra-plongée (ângulo de câmera de baixo para cima) em Cidadão Kane (1941), de Orson Welles, que busca engrandecer o personagem. Mas isso não é uma regra! O enquadramento é apenas um dos vários elementos, e não garante uma leitura direta do sentido produzido na cena.

E se, nessa linha geral, o contra-plongée tem tal efeito no espectador, o plogée (câmera de cima para baixo) provoca justamente o contrário: o personagem ou objeto pode parecer menor e mais vulnerável.

Além das questões dos ângulos, a aproximação da câmera também é crucial. Béla Balázs defende o close-up como “revelações dramáticas sobre o que está realmente acontecendo sob a superfície das aparências”. Logo, é ele que nos revela algo mais profundo sobre os personagens. Podemos ver o pronunciamento de um presidente, sentado em seu gabinete, lendo seu teleprompter friamente, mas um close-up em sua perna trêmula é capaz de nos revelar o seu verdadeiro estado de espírito.

Close-ups são as imagens que expressam a sensibilidade poética do diretor. Mostram as faces das coisas e também as expressões que, nelas, são significantes porque são reflexos de expressões de nosso próprio sentimento subconsciente. Aqui se encontra a arte do verdadeiro operador de câmera” - Béla Balazs

O close-up também chama nossa atenção para um objeto, fazendo com que o vejamos de uma forma como nunca vimos. Em Kill Bill - Volume 1 (2003), Quentin Tarantino destaca o mosquito que pica Black Mamba em primeiríssimo plano (ou em extreme close-up). É ele o responsável por despertar a personagem do coma, e sua função no enredo é destacada pelo enquadramento.

O enquadramento pode nos sugerir também a visão de um personagem, seu ponto de vista. Em Tubarão, como aponta Jennifer Van Sijll, esse recurso é utilizado para transmitir medo e está presente nos três atos do filme:

  • No primeiro ato, esses planos parecem simples imagens submersas. Mas, logo após o primeiro ataque, fazemos a conexão dessa câmera no fundo do mar com o ponto de vista do tubarão.
  • No segundo ato, já familiarizados com esse recurso, Spielberg explora a tensão no expectador: pouco antes de um ataque, no lugar de vermos os banhistas na superfície, vemos todos como o tubarão: de baixo para cima, como comida.
  • Na última utilização no filme, o ponto de vista nos predispõe ao medo quase que imediatamente, e vemos Dreyfus submerso assim como o tubarão: alguém vulnerável para a criatura.


Referências

Livros: Narrativa cinematográfica, de Jennifer Van Sijll A experiência do cinema, de Ismail Xavier A arte do cinema: uma introdução, de David Bordwell e Kristin Thompson

Filmes: Titanic (1997), dirigido por James Cameron Tubarão (1975), dirigido por Steven Spielberg Cidadão Kane (1941), dirigido por Orson Welles Kill Bill - Volume 1 (2003), dirigido por Quentin Tarantino

Autor(a) do artigo

Rafael Alessandro
Rafael Alessandro

Professor, coordenador e produtor de conteúdo no AvMakers. Rafael Alessandro é formado em Comunicação, graduando em Cinema e Audiovisual e mestrando em Cinema e Artes do Vídeo pela Faculdade de Artes do Paraná.

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