Quem assiste Metrópolis (1927), de Fritz Lang, atualmente sequer imagina as dificuldades enfrentadas pelos profissionais e empresas que se propuseram a recuperar um dos maiores filmes do cinema alemão.
Ao levar o filme para o público norte-americano em seu lançamento, a Paramount cortou cerca de 1/4 do filme. Após sua exibição em Berlim, o filme também teve sua duração alterada para se adaptar aos mesmos padrões norte-americanos. E desde então, acreditava-se que os negativos dessas cenas excluídas haviam sido eliminados para sempre.
A primeira restauração do filme aconteceu em 1972, no Arquivo Nacional de Cinema da Alemanha Oriental, porém o material de base para a restauração não estava em boas condições, resultando em um produto final de baixa qualidade. Esse problema foi contornado em uma nova restauração em 2001, agora realizada digitalmente, a partir do único negativo original até então conhecido do filme, armazenado no Arquivo Nacional de Berlim.
Nessa nova restauração, o material precisou ser completado com trechos de outras cópias do filme e também com cartelas que substituíam cenas perdidas, que foi resultado de uma longa pesquisa iniciada nos anos 1980 por Enno Patalas, diretor do Museu do Filme de Munique. Ele recorreu ao roteiro, à partitura da música e ao mapa do órgão de censura para possibilitar que o espectador finalmente entendesse toda a estrutura do filme, mesmo com as cenas faltantes.
Essa era até então a melhor versão disponível do filme, até a descoberta, em 2008, de uma cópia que as continha cenas perdidas, na Argentina. A descoberta mobilizou a Fundação Murnau, a Cinemateca Alemã, em Berlim, e o Museu do Cinema, na Argentina, para a restauração do filme.
Uma cópia do filme havia sido comprada por uma distribuidora argentina ainda em janeiro de 1927, antes dos cortes que o filme sofreu. A película foi adquirida por um crítico após ser exibida comercialmente pela distribuidora, e, por fim, foi feita uma cópia de segurança em 16mm dessa versão em 35mm que havia sido exibida diversas vezes, com falhas e sujeiras.
Foi essa cópia de segurança em 16mm que sobreviveu e foi escaneada digitalmente em 2k para a recuperação das cenas perdidas. Por se tratar de uma cópia que havia registrado fotograficamente todos os defeitos de sua matriz, não haviam muitos procedimentos físicos de limpeza que pudessem melhorar a imagem do filme.
A restauração precisou acontecer predominantemente de maneira digital. Para eliminar trepidações na imagem e a variação de luz - entre manchas claras e escuras - que era resultado das várias projeções do filme, foi necessário ensinar um software de recuperação de imagem a reconhecer o que era “defeito” e o que era a real imagem do filme.
Outro problema que a cópia encontrada apresentava era um corte superior e lateral sofrido na transferência da película em 35mm para 16mm. Na restauração, a equipe preferiu abraçar esse corte, deixando que ele ficasse evidente no material final, para evitar um reenquadramento da imagem - respeitando, assim, a visão do diretor e do fotógrafo.
Abaixo você confere a diferença na proporção de tela entre a versão restaurada de 2001 e os takes excluídos recuperados em 2008 - além da discrepância na qualidade da imagem:
Esse longo trabalho de procura, pesquisa e restauração garante não apenas que Metrópolis possa ser visto hoje de acordo com a idealização de Fritz Lang, mas que também possa ser apreciado pelas gerações futuras, evitando um apagamento da nossa história do cinema.
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Referências
Filmes: Metrópolis (1927), dirigido por Fritz Lang Metropolis - Die Restaurierung eines Filmklassikers (2011), dirigido por Christian Ehrhardt