Em 1931, o Comitê Olímpico Internacional escolheu Berlim como a sede das Olimpíadas de 1936. Dois anos depois, Hitler foi nomeado Chanceler da Alemanha por Paul von Hindenburg, e os jogos pareciam a oportunidade ideal para mostrar ao mundo que Berlim era uma cidade perfeita.
Para isso, a polícia prendeu todos que foram considerados marginais, e ciganos e judeus foram declarados estrangeiros, sendo afastados dos espaços de maior circulação turística. Os painéis antissemitas que proibiam a entrada de judeus em prédios públicos foram retirados e os estrangeiros não seriam penalizados pela prática homossexual durante os jogos.
Mas além dessa “limpeza” na cidade, ainda seria necessário um material de propaganda com um maior alcance e que fosse mais duradouro que aqueles 16 dias de evento. Financiada pelo Ministério da Propaganda nazista, Leni Riefenstahl foi convidada, então, para dirigir o filme oficial dos Jogos em Berlim: Olympia (1938).
Riefenstahl e Hitler se conheceram em 1932, durante uma projeção de seu filme A Luz Azul (1932), e um ano depois ela já estreava seu primeiro filme dirigido sob encomenda do Partido Nazista: Vitória da Fé (1933). Foi aí que Hitler percebeu no trabalho de Riefenstahl sua eficácia como meio de propaganda e seu poder de persuasão das massas.
A constante preocupação da propaganda deve ser no sentido de conquistar adeptos, ao passo que a organização deve cuidar escrupulosamente de selecionar, entre os adesistas, os lutadores mais eficientes. A propaganda, portanto, não necessita examinar o valor de cada um dos por ela convertidos, quanto à eficiência, capacidade, inteligência ou caráter […]. A propaganda estimula a coletividade no sentido de uma ideia, preparando-a para a vitória da mesma. (Hitler em “Minha Luta”)
Ciente da importância da propaganda para a popularização de seus ideais nazistas, Hitler garantiu a Riefenstahl o sonho de qualquer cineasta: recursos ilimitados e liberdade criativa em suas filmagens. E com essa carta branca do Führer, Riefenstahl dirigiu ainda Triunfo da Vontade (1935) e Dia da Liberdade. Nosso Exército (1935), antes de se dedicar a Olympia (1938).
Apesar de ter sido rodado em 1936, Olympia estreou apenas em 1938, no dia do aniversário de Hitler. O documentário foi dividido em duas partes: Festival das Nações e Festival da Beleza, que somam quase quatro horas de filme.
O domínio técnico da cineasta e de sua equipe é evidente. Temos closes dos atletas que são capazes de nos revelar suas expressões de dor e cansaço, ao passo que acompanhamos também o público em contra-plano, e vibramos com ele.
Os movimentos de câmera elaborados que já estavam presente em seus trabalho desde Triunfo da Vontade aqui são repetidos à exaustão - principalmente o movimento panorâmico e o travelling lateral, que segue os atletas com a câmera e é frequentemente utilizado até hoje em transmissões oficiais de jogos esportivos.
Porém, o que talvez mais se destaque na direção de Riefenstahl é como ela utiliza o cinema para reforçar a ideologia nazista. A diretora explora um ideal estético de beleza do corpo que retoma a tradição grega clássica. A primeira cena do filme, inclusive, promove uma fusão da escultura do Discóbolo ao corpo de um atleta que imita sua pose. E o uso da câmera lenta, também utilizada recorrentemente no longa, permitia uma decomposição do movimento dos atletas e uma melhor apreciação da beleza do corpo em exercício.
Dez meses após o lançamento do filme, as tropas alemãs invadiram a Polônia, dando início a segunda guerra. Após o fim do conflito, Riefenstahl foi julgada por sua colaboração ao Partido Nazista, mas não recebeu nenhuma punição, sendo considerada apenas uma “simpatizante” do nazismo.
Referências:
As Olimpíadas Nazistas - Berlim, 1936
Jogos Olímpicos de Berlim 1936: o uso do esporte para fins nada esportivos
Leni Riefenstahl por Adolf Hitler: Mein Kampf revela a cineasta