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Áudio e Vídeo Cinema

Psicose: uma análise do clássico de Hitchcock por Zizek

Confira a análise de Psicose, filme clássico de Alfred Hitchcock, realizada pelo filósofo psicanalista Slavoj Zizek.

há 3 anos 3 meses

Em seu documentário O Guia Pervertido do Cinema (2006), o filósofo psicanalista Slavoj Zizek traça uma análise de diversos filmes, como Dogville, Star Wars, Luzes da Cidade e Psicose. Do clássico filme de Hitchcock, Zizek se dedica a elucidar psicanaliticamente a mise-en-scène do cineasta em duas cenas: a limpeza do banheiro e o assassinato do detetive.


A limpeza do banheiro

Apesar do público geral se fixar apenas na cena do assassinato de Marion durante o banho, Zizek parece mais interessado no momento que vem logo em seguida, e que é pouco lembrado nas discussões sobre o longa: Norman Bates limpando o sangue no banheiro.

A cena que tem cerca de 2 minutos mostra com clareza cada detalhe da limpeza que o personagem faz no ambiente, e como seu trabalho é realizado com cuidado, de maneira meticulosa, eliminando qualquer vestígio do assassinato que ali ocorreu. Para Zizek, existe na cena a construção de uma identificação do espectador com a situação:

Eu penso que isso nos diz muito sobre a satisfação do trabalho, de um serviço bem feito. O que não é tanto para se construir algo novo, mas talvez o trabalho humano mais elementar - o nível zero do trabalho, por assim dizer, - é o trabalho de limpar os vestígios de uma mancha. O trabalho de apagar as manchas, afastando esse mundo subterrâneo caótico, que ameaça explodir a qualquer momento e nos engolfar. Eu penso que este seja o sentimento sutil que os filmes de Hitchcock evocam. Não é simplesmente que algo horrível aconteça na realidade. Algo pior pode ocorrer e desmantelar o próprio tecido daquilo que nós experimentamos como realidade.

Essa lembrança do mundo subterrâneo, para Zizek, é apresentada aos espectadores poucos minutos antes da cena da limpeza, quando o cineasta realiza uma fusão na montagem do ralo do banheiro com os olhos de Marion, caída morta.

Dizemos que o olho é a janela da alma. Mas e se não houver alma por trás do olhar? E se o olho fosse apenas uma fenda através da qual percebemos apenas o abismo do mundo subterrâneo?

Confira a cena completa:


O assassinato do detetive

O filósofo aponta também como Hitchcock é capaz de manipular o espectador, que sabe que tudo na cena parece levar ao assassinato do personagem, mas que mesmo assim ficamos surpresos quando ele acontece.

A tensão começa em sua caminhada até a casa dos Bates. Em seguida, quando ele passa pela porta, temos um plano e contra-plano: o detetive que encara a escada e a escada que parece encará-lo de volta.

Enquanto ele sobe os degraus, um plano detalhe registra uma porta se abrindo - denotando a presença de alguém na casa, que está ciente da companhia do detetive.

Em seguida, Hitchcock coloca o espectador no que Zizek chama de “um plano a partir de um ponto de vista divino geometricamente claro que abarca a cena toda”, quando utiliza um ângulo zenital (ou plongée absoluto) e registra a cena paralelamente ao chão em um plano geral. Nesse plano acompanhamos simultaneamente tanto o detetive que sobe as escadas quanto Norman que vem em sua direção e o esfaqueia.

Ao finalizar o primeiro ataque, assumimos então a posição do assassino, a partir de uma câmera subjetiva que registra o detetive em um primeiro plano, que cai das escadas. E essa mudança de perspectiva do público é muito significativa:

Como se passássemos de Deus, o criador neutro, a Deus em sua insuportável fúria divina. Esse assassino é para nós um monstro insondável. Não sabemos quem ele é, mas como somos forçados a assumir a posição do assassino, de certo modo, não sabemos quem nós somos. Como se descobríssemos um lado terrível de nós mesmos. Como se fossemos forçados a agir como uma marionete, um instrumento da vontade de uma divindade maligna.

Confira a cena completa:


Referências:

O Guia Pervertido do Cinema (2006), apresentado por Slavoj Zizek

Autor(a) do artigo

Rafael Alessandro
Rafael Alessandro

Professor, coordenador e produtor de conteúdo no AvMakers. Rafael Alessandro é formado em Comunicação, graduando em Cinema e Audiovisual e mestrando em Cinema e Artes do Vídeo pela Faculdade de Artes do Paraná.

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